A partir de que critério se mensura a liberdade dos indivíduos, assim como dos povos? A partir da resistência que precisa ser superada, a partir do esforço que custa para permanecer em cima. |
Dou um exemplo. As instituições liberais deixam imediatamente de ser liberais, no momento em que são alcançadas: não há depois nenhum corruptor mais incisivo e fundamental da liberdade do que instituições liberais. Se sabe em verdade, que caminhos elas abrem: elas minam a vontade de potência, elas são o nivelamento da montanha e do vale elevado à condição de moral, elas apequenam, acovardam e acostumam ao deleite: com elas sempre triunfa o animal de rebanho. Liberalismo: em alemão, animalização gregária... As mesmas instituições produzem, enquanto ainda são combatidas, efeitos completamente diversos; elas fomentam de fato a liberdade de uma maneira poderosa.
Visto mais precisamente é a guerra que produz estes efeitos, a guerra contra as instituições liberais, que, enquanto guerra, deixa persistir os instintos não-liberais. A guerra educa para a liberdade.
Pois o que é liberdade? O fato de se ter a vontade de se responsabilizar por si próprio. O fato de se suster a distância que nos distingue. O fato de se tornar indiferente à fadiga, à rigidez, à privação, mesmo à vida. O fato de se estar preparado para sacrificar os homens pela coisa sua, sem deixar de contar a si mesmo neste sacrifício.
Liberdade significa: os instintos viris, alegres na guerra e na vitória se apoderaram dos outros instintos - por exemplo, o instinto de "felicidade".
O homem que se tornou livre, e muito mais ainda o espírito que se tornou livre pisa sobre o modo de ser desprezível do bem-estar. O homem livre é guerreiro.
A partir de que critério se mensura a liberdade dos indivíduos, assim como dos povos? A partir da resistência que precisa ser superada, a partir do esforço que custa para permanecer em cima. Teria de se procurar o tipo mais elevado de homem livre lá, onde constantemente se supera a mais elevada resistência: cinco passos além da tirania, colado no umbral do risco da servidão. Isto é psicologicamente verdadeiro, se se compreender aqui sob os "tiranos" instintos implacáveis e terríveis, que exigem o máximo de autoridade e disciplina contra si: o tipo mais belo é Júlio César; isto também é politicamente verdadeiro, basta percorrer o caminho histórico.
Os povos que tiveram um certo valor, que foram valorosos, nunca o foram sob instituições liberais: o grande perigo fazia algo com eles, que merece veneração; o perigo que nos ensina pela primeira vez a conhecer nossos recursos, nossas virtudes, nosso valor e nossas armas, nosso espírito - que nos obriga a sermos fortes...
Primeiro princípio: temos de precisar ser fortes: senão nunca nos tornamos fortes. - Aquelas grandes estufas para uma espécie humana forte, para a mais forte das espécies humanas que até hoje existiu, aquelas coletividades aristocráticas à moda de Roma e de Veneza entendiam a liberdade exatamente no mesmo sentido que eu compreendo esta palavra: enquanto algo que se tem e não se tem, que se quer, que se conquista..."
─ Friedrich Nietzsche; Crepúsculo dos Ídolos
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